Ícone aos pés dos Andes

Fotografia: Divulgação
Alexandre Lalas

Alexandre Lalas

Um lugar, um vinho; uma terra, um enólogo. A Viña Gandolini nasceu a partir deste conceito, criada pelo enólogo Stefano Gandolini, uma das grandes estrelas do vinho chileno e o sócio Fernando Izquierdo Menéndez, empresário de sucesso no Chile.

 

As vinhas cobrem uma superfície total de 70 hectares e ficam na DO Maipo Andes, com altitude de 450 metros acima do nível do mar. O clima é mediterrâneo seco, com grande amplitude térmica e marcado por uma brisa fresca que sopra às tardes por conta da influência da Cordilheira dos Andes. Os solos são aluviais antigos, formados nos últimos quatro períodos glaciais, com sobreposição de camadas e base de pedra com um pouco de argila. As vinhas ficam longe do Rio Maipo e a rega por gotejamento é a regra. As uvas vêm de três vinhedos que ficam no distrito de Buin, em Alto Jahuel, Cerrillo e Catemito, plantados em 2001, 2003 e 2005, respectivamente. A densidade é alta: 7 mil plantas por hectare. A produção é pequena, e varia de acordo com o ano. Mas gira em torno de 30 mil garrafas.

A uva base é a cabernet-sauvignon, de seleção massal. A cepa foi a escolhida por conta as condições do lugar. “Aqui é um dos poucos sítios do mundo onde podemos fazer um cabernet grand cru, de classe mundial”, afirma Stefano Gandolini. “Um bom cabernet vai nascer de um solo com boa drenagem e porosidade para a aeração das raízes. Com um subsolo profundo, para que as raízes possam explorar uma área maior, obtendo água suficiente durante os períodos secos. Precisa ser um solo de baixa fertilidade, com baixos níveis de matéria orgânica e nutrientes para controlar o vigor da videira, obtendo, assim, pequenos cachos com bagas altamente concentradas e pele mais espessa. E, por fim, solos quentes para permitir que o período de quebra de brotos seja feito na hora certa e, em seguida, os cachos amadurecerem corretamente. Temos tudo isso aqui”, explica o enólogo.

 

Gandolini conhece do assunto. Trabalhou na Toscana, no Castello di Valiano, entre 1993 e 1994. Em Bordeaux, nos châteaux Pavie e Cos d’Estournel entre 1994 e 1995. No Napa Valley, na Robert Mondavi Winery, em 1996. Foi enólogo-chefe da Doña Paula, em Mendoza. Sem falar nas chilenas Carmen, Terra Andina e Vista Mar. Além Ventolera e Von Siebenthal, duas outras vinícolas com as quais o enólogo continua a colaborar.

 

Quando decidiu criar a própria vinícola, Gandolini sabia bem o que queria fazer. Uma única marca, ícone, de produção pequena e que mantivesse os mais altos padrões de qualidade possíveis. Foi atrás de um sócio. Encontrou o apoio que precisava em Izquierdo Menéndez. E em janeiro de 2011, nasceu a Viña Gandolini.

Para conferir se o enólogo obteve sucesso no sonho de fazer ali ao pé dos Andes um cabernet de classe mundial basta provar os vinhos. São grandes, em todos os sentidos. O estágio em madeira varia de acordo com a safra, podendo chegar a quase três anos em barricas francesas. O vinho não é filtrado, clarificado e nem colado. E são espetaculares.

 

Abaixo, as notas de prova de uma vertical realizada com o próprio Stefano, na adega da vinícola, com todas as safras do Gandolini Las 3 Marías Vineyards lançados até agora. Chama a atenção a impressionante consistência dos vinhos, todos superlativos e mantendo um fio condutor, mesmo com as variações de safra. Os taninos sempre firmes e a acidez viva, o que garante aos vinhos, em maior ou menor escala, dependendo ano, força e tensão.

Gandolini Las 3 Marías Vineyards 2011:

O primogênito da família estagiou 21 meses em barricas francesas. A idade só fez bem a este vinho. A fruta permanece viva e firme, com um toque bem marcado de pimenta preta e notas de grafite. Na boca é amplo, com taninos firmes e muita potência, contrabalançada com uma acidez viva que garante o equilíbrio do conjunto – 95

 

Gandolini Las 3 Marías Vineyards 2012:

O ano de 2012 foi bem mais quente do que o anterior, e isso fica claro no perfil deste vinho, cujo tempo de estágio foi o mesmo do que o irmão mais velho. Menos fruta, mais carne, com um toque bem definido de charcutaria. Traz uma salinidade não percebida no 2011, mas a mesma firmeza de taninos e uma acidez igualmente viva. Tem muito volume e embora pareça um pouco menos harmônico que o anterior, fascina justamente por ser desafiador – 96  

 

Gandolini Las 3 Marías Vineyards 2013:

Um ano bem equilibrado gerou um vinho harmônico, talvez o mais redondo de todos. O tempo de estágio em madeira foi o mesmo: 21 meses. O vinho cheira a cassis no primeiro ataque, com um leve fundo de menta e evolução para grafite. Na boca, os taninos firmes lá estão, assim como o volume, a intensidade e a profundidade. Tudo quase milimetricamente escorado por uma acidez vibrante e deliciosa – 95

 

Gandolini Las 3 Marías Vineyards 2014:

O tempo de estágio em madeira deste vinho foi bem maior do que os anos anteriores. Chegou a 31 meses. E neste momento ainda nota-se a barrica no primeiro ataque no nariz. Há também muita fruta madura, cassis. Na boca, talvez seja o mais amplo e o mais texturado de todos e o que mais fruta traz. A acidez bem vigorosa amarra tudo e faz com que o vinho passe longe de ficar over – 94

 

Gandolini Las 3 Marías Vineyards 2015:

Aqui são 32 meses de estágio, mas este tem, no nariz, menos presença da madeira do que o 2014. Há sim muita fruta (amora, cassis), pimenta e traços de bosque. Um vinho vigoroso e potente, cheio de concentração e tensão, que pede mais tempo de garrafa. Mas que desde já nasce gigante – 95

 

 

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