Ventos da Esperança

Alemanha - entre a glória e a catástrofe


Depois das tempestades na Europa Ocidental, que infelizmente afetaram importantes regiões vinícolas da Alemanha, um paralelo entre a gloriosa safra 2019 e da atual crise que afetará o mercado viticultor do país. E alternativas para conhecer os aclamados vinhos germânicos que cada vez mais caem nas graças do consumidor brasileiro.

 

Após inúmeros críticos e todo o mercado de vinhos aplaudir a bem-sucedida safra de 2019 dos vinhos alemães pela incrível qualidade, infelizmente muitas dessas preciosidades foram destruídas devido às tempestades e enchentes que recentemente castigaram a Alemanha e a Europa Ocidental como um todo. Claro que não se compara com a perda irrecuperável das vidas humanas que as águas levaram, mas para além de outros prejuízos materiais, o mercado do vinho também perdeu. Produções inteiras, estoque em barricas ou repousando em garrafas desapareceram. Uma comoção que abala o meio vinicultor. Do pequeno produtor às propriedades históricas do país germânico. Uma catástrofe em meio a ascensão dos vinhos alemães em todo o mundo. Tanto que em artigo, o crítico James Suckling destilou elogios sobre algumas amostras de vinhos do país da 2019 e bem lembrou que duas crises emolduraram os vinhos dessa safra: a crise climática e a pandemia da Covid19 que manteve boa parte dos vinhos ainda nas barricas. “2019 é uma safra alemã clássica com uma estrutura de acidez como a de 2001, mas combinada com mais maturação”, declarou Cornelius Donnhoff da propriedade Donnhoff à época. Veramente, para Stuart Pigott, crítico da equipe do Suckling, que avalia os vinhos alemães há 2 décadas, a “2019 foi a safra de todas as safras, a melhor da (sua) vida.”

 

Com isso, qualquer leigo poderá prever que os próximos meses (quiçá os próximos anos) serão pontuados pela produção e comercialização limitada de vinhos da Alemanha. Principalmente da safra em questão.

Então, particularmente, como operário do mercado de vinhos, sim me considero um trabalhador apaixonado por esse mundo (bem mais que empresário, CEO do Sonoma Market), me empolgo pela introdução no marketplace do Sonoma Market, de novos vinhos da Alemanha, todos produzidos em vinícolas de renome e que estão disponíveis   no mercado brasileiro. Toda essa aquisição foi realizada em parceria com os sellers do Sonoma Market. Importadoras que acreditam no marketplace da empresa. Assim, em conjunto, oferecemos a oportunidade para que os apaixonados por vinhos possam desfrutar dessas maravilhas engarrafadas. Propriedades como Dr Bürklin-Wolf, Baron Knyphausen, Reichsgraf von Kesselstatt, Fürst Hohenlohe Oehringen, entre outras.

Mesmo com o aquecimento, a Alemanha se manterá um país frio, o que significa ter regiões vinícolas mais frias que Bordeaux, Rioja, Toscana ou Napa, por exemplo, uma vez que essa região também sofre com o aquecimento global. E essa mudança de clima é benéfica para a Alemanha, afinal vale lembrar que com baixas temperaturas, a riesling tem dificuldade para amadurecer resultando em safras quentes desde 2014 para os vinhos vintages.

Para muitos, que nem sabiam que a Alemanha produz vinhos, muito menos que é um dos produtores mais importantes do mundo, vale aprofundar um pouco. A Alemanha tem uma história milenar de viticultura, hoje dezenas de vinícolas do país possuem uma história contínua de produção e cultivo própria de 700, 800, 900 anos. A Rheingau, considerado berço natal da uva Riesling, há mil anos é considerado um polo da viticultura europeia, tanto que até os grandes sommeliers e especialistas da época do Napoleão Bonaparte não podia deixar fora a Riesling ao listar as “6 castas nobres” do vinho (pouca surpresa que as outras 5 foram franceses).

O projeto do Sonoma Market em parceria com seus sellers, de oferecer uma plataforma para a descoberta de mais vinhos alemães vem de encontro com o feliz crescimento no consumo de vinhos no Brasil (18,4% segundo a Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), assim como o aumento do interesse do consumidor por provar vinhos de países não muito conhecidos e, mesmo com sua longa história no mundo do vinho, a Alemanha se encaixa nesse cenário.

É possível que tenha um próspero caminho pela frente com o consumidor brasileiro. Ainda há resquícios dos anos 90 com o emblemático Liebfraumilch (o vinho da garrafa azul). Não morava no Brasil naquela época, e controvérsias à parte, o Liebfraumilch mostrou que o Brasil é aberto para novidades, mas hoje a qualidade de vinho alemão está melhor que nunca, inclusive os importados para o Brasil, que em qualidade e estética em nada lembram a garrafa tão difundida e polêmica.

Se você ainda sente a ressaca daquela época, não tenha medo. Estes vinhos que compõem a seleção atual do Sonoma Market, seleção essa feita com muita dedicação e cuidado, uma vez que não importamos, mas sim, somos curadores de curadores (trabalhamos com outras importadoras), são vinhos por vezes maduros e concentrados, outras delicados e etéreos, porém de aromas intrigantes e com equilíbrio entre frescor e acidez - de tirar o fôlego quando provados. Destaco alguns favoritos, inclusive da safra 2019:

 

Schloss Reinhartshausen Rheingau Riesling Kabinett Feinherb 2017

De uma vinícola fundada em 1337 no coração do Rheingau vem este achado que mostra excelente tipicidade da casta Riesling, com aromas de petroláceo e plastico características e esperadas, que dão lugar a frutas amarelas e um paladar repleto de carambolas, néctar de pêssego, damasco e mel de laranjeira. Com um toque de doçura e excelente acidez, altamente agradável. 

 

Dr. Burklin-Wolf Riesling Trocken 2019

Pelo “Rei dos Rieslings Secos”, um produtor Biodinâmico de Pfalz, região que se destaca por brilhantes jovens produtores versões da riesling mais minerais e sérios do que opulentos. Com frutas amarelas no nariz e um leve petróleo, abre aos poucos. Em boca totalmente seco, com excelente acidez e boa frescor. 

 

Baron Knyphausen “Gutswein” 1141 Riesling Trocken 2019.

Na produção de Riesling há quase 900 anos, a propriedade arrasou nesta safra. Um vinho para decantar. Inicialmente fechado, com o passar de meia hora senti pêssego não madura, jasmim, um lindo querosene (isso mesmo! Aroma típica da casta) e carambola na taça. Em boca maresia e raspas de limão fazem um belo contraponto à leve doçura natural. Após uma hora este vinho começou a brilhar, a acidez ganhando destaque. De corpo médio, para harmonizar com quiche de chevre. 

 

Fürst Hohenlohe Oehringen Spätburgunder Trocken Orgânico 2018

Nunca provou um Pinot Noir alemão? A hora é agora. Conhecido como spätburgunder no país, esta versão é mais delicada e sutil do as que são mais comuns no novo mundo, de clima frio tem mais a ver com a Pinot da Alsácia (ou Patagonia) do que Mendoza. De solos de calcário e gis, passou por 6 meses em barrica sem perder a sutileza, as framboesas frescas, os toques minerais. Uma delícia. 91 pontos

 

Este vinhos, e outros que compõem a seleção atual, expressam o solo e a localização das 13 regiões vinícolas da Alemanha, seus distintos terroirs e as centenas subdivisões dentro deles – os  Bereich (distrito), Großlage (local de vinhedo coletivo) e Einzellage (local de um único vinhedo).

Junto a isso estão as mãos que fazem o vinho e aí entra a experiência e a dedicação dos viticultores. A maioria dos novos rótulos destacados são de produção orgânico e/ou biodinâmico, um fator que se tornam cada vez mais importantes, na minha opinão, a escolhas assertivas de produtores adeptos, que têm menos margem para errar. Dos frutos que emergem das encostas expostas ao sul ou sudoeste em vales protegidos, como no Reno e seus afluentes ou no Elba, Saale e Unstrut, esses artesãos que cuidadosamente respeitando o solo, terroir e a história geográfica da vinha, extraem o melhor com o mínimo de intervenção.

 

O resultado são vinhos únicos que prometem conquistar o paladar do brasileiro. A Alemanha está em ascensão no Brasil e ficamos felizes em fazer parte disso. Certamente, tem assuntos para serem trabalhados ainda, um caminho longo pela frente. Diferente dos rótulos dos países latinos ou até da França, a pronúncia dos nomes dos alemães não é algo que muitos enófilos brasileiros conseguem enfrentar com sucesso imediato. Já as classificações de qualidade e de nível de doçura são únicas e precisam ser aprendidas. Esqueça de Reserva e Gran Reserva. VDP? Gross Gewachs? A diferença entre Trocken, Spätlese, Auslese? Para ser difundido e entendido, mas é um assunto que vale muito a pena.

 

Alykhan Karim

CEO do Sonoma Market

 

 

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